Pedro José Labronici, Luiz Galeno, Thiago Martins Teixeira, José Sergio Franco, Rolix Hoffmann, Paulo Roberto Barbosa de Toledo Lourenço, Vincenzo Gio
PONTO DE ENTRADA PARA AS HASTES INTRAMEDULARES ANTERÓGRADAS DO FÊMUR: ESTUDO EM CADÁVER
Pedro José Labronici, Luiz Galeno, Thiago Martins Teixeira, José Sergio Franco, Rolix Hoffmann, Paulo Roberto Barbosa de Toledo Lourenço, Vincenzo Giordano, Alexandre Pallottino, Ney Pecegueiro do Amaral
Rev Bras Ortop. 2009;44(6):487-90
Resumo Objetivo: Analisar a saída natural do fio-guia no trocânter maior pela via retrógrada do fêmur, em espécimes de cadáver. Métodos: 100 fêmures foram perfurados entre os côndilos femorais, a 1,2cm da região intercondilar. Um fio-guia reto de 3mm foi introduzido, de forma retrógrada, até alcançar a extremidade proximal do fêmur. Foram avaliados em relação à região posterossuperior e anterossuperior do trocânter maior, fossa piriforme e linha mediana superior entre a cabeça-colo e trocânter maior. Resultados: Em 62% o fio-guia reto saiu na face anterior do trocânter maior. Na fossa piriforme, a distância mediana observada foi de 1,0cm e a amplitude interquartílica, de 0,5cm, expressando inicialmente, em relação à fossa piriforme, melhor precisão. Conclusão: O eixo central do canal medular, na incidência coronal, projetou melhor precisão na região da fossa piriforme. Descritores - Fêmur; Fixação intramedular de fraturas; Cadáver. |
1 - Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo-Escola Paulista de Medicina; Chefe de Clínica do Serviço de Ortopedia e Traumatologia Prof. Dr. Donato D'Ângelo - Hospital Santa Teresa, Petrópolis/RJ, Brasil.
INTRODUÇÃO Para se obter sucesso quando se utiliza a técnica da haste intramedular anterógrada para o tratamento das fraturas do fêmur, além de se ter um bom conhecimento da anatomia da extremidade proximal do fêmur, deve-se saber escolher o ponto de entrada correto para introdução da haste. O objetivo principal em definir o ponto de entrada é conseguir um alinhamento anatômico dos fragmentos ósseos. Existem diferentes opiniões na literatura sobre o melhor local do ponto de entrada na extremidade proximal do fêmur. Alguns autores preferem a ponta do trocânter maior(1-3). Outros preferem a fossa piriforme, pois acreditam que esta localização seria o eixo entre o trocânter e a diáfise femoral(4-7). Também têm sido descritas as regiões do terço anterior e dois terços posteriores da ponta do trocânter maior(8,9). O objetivo deste trabalho foi analisar a saída natural do fio-guia no trocânter maior pela via retrógrada do fêmur, em espécimes de cadáver. Métodos Foram utilizados 100 fêmures da Faculdade de Medicina de Petrópolis/RJ. Foram excluídos os fêmures com deformidades prévias, sinais de fraturas ou desgaste do trocânter maior e/ou côndilo femoral. Dos espécimes anatômicos, 47 eram do lado direito e 48 do esquerdo. Todos os espécimes femorais foram perfurados com uma broca de 6mm entre os côndilos femorais, a 1,2cm da região intercondilar(10,11). Um fio-guia reto de 3mm foi introduzido, de forma retrógrada, até alcançar a extremidade proximal do fêmur. Cinco fêmures foram excluídos devido a fraturas do trocânter maior durante o procedimento de passagem do fio-guia, totalizando 95 espécimes anatômicos. O local de saída do guia foi medido em relação à região posterosuperior (PST) e anterossuperior do trocânter maior (AST), fossa piriforme (FP) e linha mediana superior entre a cabeça-colo e trocânter maior (Figuras 1 e 2). Resultados
Este estudo teve por finalidade traçar um perfil da frequência do fio-guia na região trocantérica, após introdução por via retrógrada na região intercondilar do fêmur em 100 espécimes anatômicos. Foram descartados cinco fêmures, pois ao introduzir o fio-guia houve fratura do trocânter maior, o que impossibilitou a tomada das medidas. Este trabalho foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Medicina de Petrópolis. A tabela 1 fornece as medidas de tendência central e de dispersão das distâncias em relação ao ponto de entrada retrógrado de 95 fêmures com média, desvio padrão (DP), moda, 1° quartil, 2° quartil (mediana), 3° quartil, percentil de 10%, percentil de 90%, mínimo e máximo. Distância em relação à região anterossuperior do trocânter. Dos 95 espécimes estudados, 100% dos casos estão entre o valor mínimo e máximo. que foi de 0,5 a 2,8cm; 90% não ultrapassaram 2,3cm (percentil 90%). A distância mediana observada foi de 1,5cm e a amplitude interquartílica (AIQ = Q3-Q1), de 0,6cm. Distância em relação à região anteroposterior do trocânter Dos 95 espécimes estudados, 100% dos casos estão entre o valor mínimo e máximo, que foi de 1,0 a 3,7cm; 90% não ultrapassaram 2,9cm (percentil 90%). A distância mediana observada foi de 2,3cm e a amplitude interquartílica (AIQ = Q3-Q1), de 0,6cm. Distância em relação à fossa piriforme Dos 95 espécimes estudados, 100% dos casos estão entre o valor mínimo e máximo, que foi de 0 a 2,5cm; 90% não ultrapassaram 1,54cm (percentil 90%). A distância mediana observada foi de 1,0cm e a amplitude interquartílica (AIQ = Q3-Q1), de 0,5cm, que foi a menor distância entre as regiões anatômicas considerados, expressando inicialmente, em relação à fossa piriforme, melhor precisão (Figura 3). Discussão A haste intramedular anterógrada é um procedimento padrão para as fraturas da diáfise do fêmur, tanto nas fraturas fechadas como nas expostas(12,13). Apesar de existirem os pontos de referência anatômicos na extremidade proximal do fêmur, o cirurgião pode encontrar alguma dificuldade em localizar o ponto de entrada ideal quando opta pelo tratamento com a haste intramedular. Muitos autores apontam a grande importância do ponto de entrada correto na haste intramedular anterógrada(1,14,15); a escolha errada do local pode causar várias complicações intraoperatórias como deformidades angulares no pós-operatório(5,14-19). As informações sobre a correta localização do ponto de entrada são raramente encontradas na literatura e são controversas e confusas(2,9,20,21). Na descrição original de Küntscher, citado por Gausepohl et al (2), ele somente menciona que o puncionador é colocado na ponta do trocânter maior sob o controle fluoroscópico. Christensen(21) simplesmente mencionou que a ponta do trocânter, e não a fossa trocantérica, deveria ser usada para a inserção da haste. Outros autores recomendam que o ponto de entrada seja colocado sobre a face medial do trocânter maior(22,23). Hansen e Winquist(24) recomendaram um ponto entre a junção do colo femoral e o trocânter. Porém, não demonstraram a exata localização anatômica do ponto de entrada ou enfatizaram a posição no plano sagital. Kempf et al(1) acreditam que o ponto de entrada ideal é a ponta do trocânter, porém, sugerem um ponto mais medial da parede do trocânter na fratura proximal do fêmur. Mais recentemente, vários autores têm recomendado um ponto de entrada medial e posterior ao trocânter maior, na fratura da extremidade proximal do fêmur(5,25,26). Georgiadis et al(9) utilizando somente a parte superior do fêmur, até o seu istmo, definiram como o ponto de entrada ideal sendo no trocânter maior, em uma posição mais dorsal, comparada à inserção tendinosa do músculo piriforme. Gausepohl et al(2) incluíram em sua pesquisa o terço distal do fêmur, considerando a curvatura natural do fêmur; resultados demonstraram que o ponto de entrada ideal ficou significantemente mais ventral sobre a inserção do músculo piriforme. Harper et al(27) introduziram guias intramedulares de 3mm de diâmetro de forma retrógrada na região intercondiliana do fêmur. Concluíram que a ponta do trocânter não foi a saída mais natural do guia e que o melhor local foi a junção entre o colo do fêmur e o trocânter. Nossos resultados, também utilizando um guia de 3mm de diâmetro introduzido de forma retrógrada a 1,2cm na região intercondiliana do fêmur, região considerada ser o centro do fêmur, demonstraram resultados relativamente uniformes. A saída natural do guia ficou na fossa piriforme, que demonstrou um intervalo menor (distância mediana de 1,0cm e a amplitude interquartílica de 0,5cm). Isso significa melhor precisão e provavelmente se reproduz com melhor confiabilidade. A curva de raio do fêmur deve ser considerada quando se opta pelo tratamento das fraturas do fêmur com a haste intramedular. O ponto de entrada neutro pode ser obtido, iniciando o seu posicionamento na fossa trocantérica ou na ponta do trocânter, não mais que 2cm da região posterior do trocânter(9). Observamos que no posicionamento do fio-guia, em relação à região anteroposterior proximal do fêmur, 62% tiveram a saída anterior à linha média do fêmur. Isso pode ter sido devido à utilização de um fio-guia reto, não acompanhando a curva de raio do fêmur, o que pode ser um fator de crítica. Harper et al(27) introduziram implantes com curva de raio (203cm e 137cm) e encontraram um ponto de entrada localizado dorsal ao trocânter, resultado diferente do encontrado quando utilizaram fio-guia reto, que ficou mais anterior. Conclusão O eixo central do canal medular, na incidência coronal, projetou melhor precisão na região da fossa piriforme. Para hastes retas, a melhor localização do ponto de entrada é a fossa piriforme. REFERÊNCIAS
1. Kempf I, Grosse A, Beck G. Closed locked intramedullary nailing. J Bone Joint Surg Am. 1985;67(5):709-20. |